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Como as novas diretrizes ambientais impactam as decisões dos prefeitos e prefeitas sobre uso do solo, preservação e planejamento urbano sustentável
A preservação ambiental não é mais exclusividade de órgãos estaduais e federais. A nova fase da legislação ambiental brasileira, especialmente após a atualização do Código Florestal (Lei nº 12.651/2012 e a recente Lei nº 14.285/2021), reforça o papel das prefeituras na gestão de áreas verdes urbanas, nascentes e margens de rios. Agora, os municípios podem — e devem — assumir protagonismo na definição de Áreas de Preservação Permanente (APPs) em regiões urbanas consolidadas. Segundo a definição legal vigente, Área de Preservação Permanente – APP é a área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. A definição das faixas mínimas numa regra geral nacional procura garantir que as funções dessas áreas sejam minimamente resguardadas no território nacional, tanto no espaço rural quanto urbano.
A novidade traz desafios, mas também oportunidades para as gestoras e gestores públicos municipais construírem e ampliarem cidades mais resilientes, organizadas e ambientalmente equilibradas.
O Código Florestal é a principal lei brasileira que regulamenta o uso e a proteção da vegetação nativa em áreas rurais e urbanas. A versão atualizada permite aos municípios fixarem suas próprias faixas de APP nas zonas urbanas, desde que haja planejamento ambiental, participação social e respaldo técnico.
Esse novo desenho normativo dá aos prefeitos autonomia para integrar políticas de habitação, drenagem, saneamento e planejamento urbano com a proteção de mananciais, encostas e margens de córregos e rios, caracterizando uma chance real de adequar a Legislação Federal com a realidade de cada município. Quanto maior o poder concedido ao Executivo, também vêm novas responsabilidades.

As prefeituras agora precisam realizar diagnósticos ambientais das bacias hidrográficas e também dos mananciais hídricos dos seus municípios integrando os dados coletados aos Planos Diretores e de saneamento básico no que se refere ao armazenamento, tratamento e distribuição de água potável e esgoto. Promover audiências públicas e ouvir os conselhos municipais de meio ambiente além de delimitar e fiscalizar as áreas de preservação permanente, as APPs, com critérios técnicos e, assim, evitar flexibilizações abusivas. O risco de flexibilizar demais a proteção ambiental, sob pretextos de “utilidade pública” ou “interesse social”, exige atenção redobrada dos gestores para não comprometer áreas sensíveis e fundamentais à segurança hídrica da população.
Com os desafios e responsabilidades ampliadas, algumas ferramentas podem ser utilizadas por ocasião do planejamento de preservação dos mananciais hídricos com destaque para a elaboração de um Plano Diretor e zoneamento urbano com a finalidade de integrar a ocupação urbana com a proteção das áreas de preservação. Claro que o plano diretor precisa ser alicerçado em um plano de saneamento básico que gera o apoio necessário para destacar as áreas sensíveis e combate aos riscos de mananciais hídricos.
Um cadastro ambiental urbano pode mapear as áreas protegidas e promove a regularização junto ao Conselho municipal de Meio Ambiente o que facilita as avaliações de obras e projetos que eventualmente poderiam afetar as áreas diagnosticadas como de mananciais hídricos. São cuidados que, definitivamente, se somam com a oportunidade de compartilhar soluções e visam fortalecer, cada vez mais, a gestão pública da área urbana e rural do município.

Citando alguns exemplos no mundo, cidades como Cingapura, conhecida como “Cidade no Jardim”, Medellín na Colômbia e Curitiba, no Paraná são exemplos de cidades que implementam infraestrutura verde e protegem margens de rios com cinturões vegetais. Cingapura utiliza políticas de compensação ambiental, obrigando edifícios a compensarem o espaço construído com áreas verdes. Medellín criou os “Corredores Verdes de Medellín”, que conectam parques, encostas e avenidas com vegetação nativa, reduzindo a temperatura e melhorando a qualidade do ar. Curitiba implementou um sistema de parques conectados a canais e bacias naturais para conter enchentes.
Em Florianópolis (SC), a combinação de critérios topográficos e ambientais é essencial para a delimitação das Áreas de Preservação Permanente (APPs) em áreas urbanas, especialmente em regiões de encosta. Isso ocorre porque as encostas são áreas mais frágeis e suscetíveis a impactos ambientais, como erosão, deslizamentos e alterações na qualidade da água.
Paragominas, no estado do Pará, é reconhecida como pioneira na aplicação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) para combater o desmatamento, com o apoio do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IPAM) e outros parceiros. O município implementou o CAR que permite o monitoramento e controle das propriedades rurais e urbanas, incluindo a identificação de áreas de desmatamento e a verificação do cumprimento da legislação ambiental.
A infraestrutura verde não apenas melhora o meio ambiente, mas também a saúde e o bem-estar social dos habitantes. As árvores produzem oxigênio, reduzem gases de efeito estufa e captam partículas finas do ar. A arborização urbana também traz benefícios econômicos, sociais e para a fauna, e as soluções de infraestrutura verde incluem parques, reservas naturais, quintais, jardins, vias navegáveis, áreas alagadas, corredores de transporte verdes, alamedas, praças, coberturas verdes, jardins verticais, campos esportivos e ruas arborizadas.

Drones para ajudar no monitoramento de mananciais hídricos e florestas Foto: Jason Blackeye Agencia Brasil |
Porém, há riscos e gargalos que precisam permanecer no radar dos gestores principalmente pelos recursos e valores humanos escassos e com capacitação técnica para conduzir análises ambientais que facilitam as decisões dos gestores públicos, aliado à falta de orçamento para a fiscalização, conscientização local e educação ambiental e considerando ainda eventuais e consistentes pressões do setor de empreendimentos imobiliários por flexibilizações irregulares, o que pode remeter a crimes de responsabilidade.
Os caminhos pelos quais a gestora ou o gestor municipal pode levar em conta para combater os riscos e gargalos é efetivar parcerias com universidades e ONGs organizadas para suprir a capacitação técnica e também buscar recursos federais e estaduais para a proteção ambiental rural e urbana dos seus municípios. O uso da tecnologia com monitoramento de drones, criação de fundos municipais financiados por empresas de iniciativa privada por compensações ambientais e recursos originários de multas por infração no setor além de gerar incentivos junto às comunidades urbanas e rurais da responsabilidade em recuperar áreas de preservação permanente com plantio de floras nativas.
A reforma do Código Florestal fortaleceu a gestão ambiental dos municípios. Ao assumir o protagonismo na definição das APPs urbanas, os prefeitos e prefeitas se tornam atores centrais na construção de cidades que respeitam o meio ambiente sem abrir mão do crescimento. Mas essa autonomia exige compromisso.
Só com planejamento técnico, participação social e visão de longo prazo será possível transformar a nova lei em qualidade de vida para os cidadãos e em proteção efetiva dos nossos recursos naturais. O futuro das cidades passa, também, pelas florestas que as cercam.
Da Redação