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Brasil caça mais aplicações na área socioambiental, porém choca com questões regulatórias

Desmatamento e queimadas na região de Porto Velho, em Roraima — Foto: Foto: Edilson Dantas. Fonte: O Globo

Bancos de fomento procuram aliar oferta de crédito a princípios ESG para o país, que pode se tornar celeiro de soluções globais no mercado, dizem especialistas

Em um momento em que as políticas climáticas preocupam a sociedade e deixam de se restringir ao setor ambiental, especialistas avaliam que o Brasil tem condições de atrair maiores volumes de investimentos globais em iniciativas que ajudem a combater as mudanças climáticas. Mas mesmo que o país tenha recursos naturais atraentes, como fontes para desenvolver energias renováveis, a atração de capital segue sendo um desafio. A relação entre risco e retorno das nações emergentes, aí incluído o Brasil, tende a tornar mais difícil o acesso a financiamentos para projetos em relação a regiões mais desenvolvidas.

Os temas fizeram parte do evento “O Desafio de Financiar o Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável”, que aconteceu na semana passada no Rio, o terceiro do projeto “G20 no Brasil”, promovido pelos jornais O GLOBO e Valor e rádio CBN, que incluiu discussões sobre transição energética, redução das desigualdades e erradicação da extrema pobreza.

Segundo dados da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), o mundo deve atingir em 2024 o recorde de US$ 3 trilhões em investimentos em energia. Destes, US$ 2 trilhões devem ser direcionados para energia limpa e US$ 1 trilhão para fontes fósseis. Há cinco anos, o investimento em energia limpa rondava US$ 1,2 trilhão.

A dificuldade de atração de investimentos por parte dos países em desenvolvimento foi um dos desafios destacados pelos especialistas no encontro. Sócia da Catavento Consultoria, Bruna Mascotte afirmou que os emergentes precisam desenvolver alternativas para garantir os recursos e fazer com que o dinheiro chegue até os projetos.

— Além das políticas públicas, o setor privado desempenha importante papel na alocação, mas há também o desafio do custo de capital e do ambiente regulatório, que não ajudam — disse Bruna — Mesmo entre países emergentes, a distribuição não é igualitária.

Um estudo da BloombergNef afirma que, em 2023, foram investidos US$ 35 bilhões em transição energética nos países nesse nível de desenvolvimento. Na lista, o Brasil está à frente da Índia. Mas os países africanos só investiram cerca de 3% desse total.

Papel do BID

Na visão da especialista, a boa notícia é que a necessidade atualmente é de investir em tecnologias que são maduras, o que mitiga possíveis riscos tecnológicos:

— A questão é endereçar os desafios, como a dificuldade de ter um ambiente de negócios atraente, com estabilidade jurídica. A viabilidade econômica dos projetos é prejudicada mesmo com o Brasil apresentando recursos solares e eólicos eficientes.

O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) é um dos agentes envolvidos na tarefa de fazer avançar a pauta do investimento em transição energética. Morgan Doyle, representante do BID no Brasil, que esteve no evento, afirmou que uma das atuações do banco é conectar os investidores privados aos projetos alinhados às práticas ESG, sigla para políticas ambientais, sociais e de governança:

— Nosso papel é articular com diversos atores para trazer inovações que possam ter impacto na discussão para que os projetos saiam do papel e para servir de ponte entre a poupança global, que tem muito interesse em financiar projetos alinhados em ESG bem estruturados. Além disso existe percepção desmedida de risco. Além de financiar, queremos trazer outros (agentes) para aproveitarem as oportunidades.

O banco aprovou em 2024 um incremento de capital no BID Invest, seu braço privado, com projetos de parcerias público-privadas (PPPs) que permitirão dobrar a capacidade de emprestar.

— O Brasil vai ser um dos principais beneficiados do incremento — disse Doyle.

Os acordos assinados em fevereiro deste ano somaram US$ 5,4 bilhões com o Ministério da Fazenda, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o Banco Central do Brasil para incentivar investimentos e oferecer proteção cambial a projetos que promovam a transição para práticas sustentáveis. A organização também apoiou o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima com uma linha de crédito de US$ 2 bilhões e colocou à disposição do Banco Central um limite de US$ 3,4 bilhões para coberturas cambiais.

O Brasil corresponde à maior carteira do BID atualmente, com US$ 20 bilhões em projetos com setores público e privado. Para Morgan Doyle, os aportes funcionam como instrumentos de garantia e de atratividade para outros investidores globais:

— Um dólar pode atrair três ou quatro e viabilizar investimentos em áreas como resiliência climática, infraestrutura ou em novas fronteiras de desenvolvimento, como hidrogênio verde e combustível sustentável de aviação. O Brasil pode ser um celeiro de novas soluções globais em áreas ambientais e sociais. Por isso, viabilizar essas ferramentas com o apoio financeiro adequado é essencial.

Recursos do governo

A disponibilidade de recursos governamentais é um ponto que diferencia o estágio dos países na adoção de práticas de transição energética. Carolina Grottera, diretora de programa da secretaria executiva do Ministério da Fazenda, afirma que, ainda que o Brasil passe por um cenário fiscal desafiador, existe um compromisso da União em combater os efeitos das mudanças climáticas, apesar de ser com menos recursos do que para outras iniciativas, como o combate à pobreza.

Carolina afirma que, ainda que não exista o espaço fiscal necessário, o país tem promovido instrumentos que direcionem recursos para setores estratégicos ou que alavanquem investimentos domésticos e internacionais. A diretora cita, como exemplo, o plano de ação desenvolvido pela Fazenda para desenvolver uma “taxonomia sustentável”, com classificações para definir de forma objetiva os ativos ou categorias que contribuam para objetivos climáticos.

— Vamos ter uma definição de o que é sustentável ou não para que os agentes e o próprio governo possam dar mais incentivos para atividades que ajudem a descarbonizar a economia. É útil para evitar o greenwashing (falsas práticas sustentáveis).

Pedro Ferreira de Souza, sociólogo e pesquisador do Ipea, que também compôs a mesa, destacou a capacidade brasileira de aprimorar a gestão de programas sociais nos últimos anos, como o caso do Bolsa Família:

— Aconteceu por um processo importante de aprimoramento, precisamos reconhecer os sucessos do país.

Fonte: O Globo

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