O debate sobre as cidades inteligentes, do inglês smart cities, está ganhando cada vez mais destaque no cenário nacional e mundial. Para discutir a importância dos indicadores que apontam a inteligência, conexão e sustentabilidade desses municípios, que usam de tecnologia na coleta de dados e infraestrutura moderna para garantir ambientes urbanos mais eficientes e convenientes, a Escola Superior de Gestão e Contas Públicas (EGC) do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP) realizou, no dia 9/11, em ambiente virtual, palestra com especialistas convidados.
O evento contou com a participação do presidente do TCMSP, conselheiro João Antonio da Silva Filho, e do conselheiro corregedor da Corte de Contas, Eduardo Tuma.
O presidente do TCMSP ressaltou a relevância e atualidade do debate no enfrentamento dos desafios futuros, com maior eficiência e aproveitamento de tecnologia, especialmente em uma cidade com as dimensões e a complexidade de São Paulo. João Antonio destacou recente reportagem do portal Olhar Digital que divulgou que a cidade ficou em primeiro lugar no Ranking Connected Smart Cities 2020 como a mais inteligente e conectada do Brasil, seguida por Florianópolis e Curitiba. O estudo está na 6ª edição e mapeia os 673 municípios com mais de 50 mil habitantes, com o objetivo de definir as cidades com maior potencial de desenvolvimento.
“São Paulo se destacou nas categorias de mobilidade e acessibilidade, mas também considero que está bem à frente nos setores de tecnologia e informação porque temos três parques tecnológicos e onze incubadoras que, de acordo com a pesquisa, são responsáveis por 4,1% dos empregos formais do município. Além disso, a capital paulista contabiliza 85 pontos de acesso à internet por 100 habitantes”, afirmou o conselheiro.
João Antonio também citou o recente leilão promovido pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para a exploração da oferta da tecnologia 5G no Brasil, que possibilitará o avanço significativo das cidades inteligentes. “No âmbito de atuação dessa Corte de Contas o tema se torna cada vez mais presente nas contratações e desenvolvimento de políticas públicas no município. Exemplo disso foi a recente licitação conhecida como PPP da iluminação pública, cujo tema smart cities foi amplamente discutido pelo corpo técnico e pelos conselheiros deste Tribunal, em razão das diversas possibilidades para exploração do parque de iluminação pública por meio de mecanismos propiciados pelas novas tecnologias”, afirmou.
O conselheiro Eduardo Tuma enfatizou que falar sobre cidade inteligente é antes de tudo usar a tecnologia com a finalidade de melhorar a qualidade de vida do cidadão, na implementação de políticas públicas com mais profundidade, produtividade e exatidão, a um custo menor ao erário. “A ideia é melhorar o serviço, gastar menos, prestar o atendimento de forma mais rápida e garantir maior conectividade ao cidadão”, pontuou.
O corregedor da Corte de Contas paulistana destacou que aliado à definição das cidades inteligentes está o conceito do governo digital, que além de estar presente fisicamente, por meio dos serviços prestados como os de zeladoria, também deve se fazer pontual no meio virtual. “A Lei Orgânica do Município incluiu nos direitos e garantias fundamentais o acesso à internet. São Paulo foi uma cidade inovadora nesse sentido e isso mostra a importância que tem a inclusão digital como política pública. O governo digital tem que se preocupar em incluir digitalmente o cidadão. A exclusão digital atualmente é tão danosa quanto a exclusão social e a inclusão digital permite maior inclusão social porque diminui distâncias”, avaliou ele.
Eduardo Tuma ainda salientou a necessidade do acompanhamento dos indicadores para que o uso da tecnologia pelas cidades inteligentes tenha um propósito determinado. “O uso da tecnologia pelas cidades inteligentes tem que ter uma finalidade e essa dinâmica é medida por meio de indicadores. Por isso a necessidade de parâmetros e métricas que mostrem o quanto a tecnologia melhora ou não a vida do cidadão”, completou.
Professor livre-docente do departamento de Engenharia de Produção da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) e coordenador do grupo de pesquisas focado em cidades inteligentes Conecticidade, Marcelo Schneck de Paula Pessôa falou sobre os aspectos conceituais da gestão por indicadores. “Os indicadores de desempenho são medidas que comparam o que foi realizado com a expectativa ou o objetivo a ser alcançado. Apontam, mas não resolvem problemas. Servem como ferramentas de gestão. Quanto menor o número de indicadores mais focado será o trabalho de gestão”, explicou ele, que é também vice-presidente do conselho curador da Fundação Vanzolini.
O palestrante apresentou o Grupo de pesquisa LCTU- Laboratório de cidades, tecnologia e urbanismo, do qual é integrante e destacou que os estudos estão sendo realizados nas áreas de gestão pública, formação social, economia e negócios, infraestrutura e superestrutura, emergência, arquitetura e urbanismo e cultura e lazer, que segundo ele “são os focos que entendem que uma cidade inteligente deve ter”. Contou, também, sobre os projetos em andamento, como o estudo de viabilidade de aplicação de drones para atividades em cidades inteligentes e reforçou a importância da gestão por indicadores.
“A construção de um indicador parte de um objetivo a ser atingido (estratégico, tático ou operacional). A partir do objetivo são estabelecidos critérios de interpretação e variáveis ou atributos de importância que dizem como esse objetivo deve ser medido. Tenho que ter o alinhamento de um objetivo para fazer a medição e através dessa medição verificar se estou conseguindo atender o objetivo”, avaliou o especialista.
Com relação a construção de um sistema de indicadores para uma boa gestão revelou que é necessário construir um conjunto coerente de indicadores que serão desdobrados em estratégias e distribuídos para cada base da organização. Numa regra prática, afirmou que um gestor consegue gerenciar bem até sete indicadores para que não perca o foco. “Tendo um sistema de indicadores permanente e de longo prazo, há continuidade no processo de planejamento de gestão”, concluiu o palestrante.
Clarice Kobayashi, engenheira elétrica pela Poli-USP, com MBA em Gestão Empresarial pela Business School São Paulo (BSP), destacou que a visão de planejamento a longo prazo das cidades inteligentes é um desafio para a sociedade. “A Inglaterra realizou um planejamento de 50 anos enquanto Londres trabalha com um horizonte de até 25 anos. O Smart London é um projeto de planejamento que prioriza a criação das políticas e estratégias que possam melhorar o uso da tecnologia para as pessoas, que estão sempre no centro. Com a abordagem a longo prazo as intervenções são possíveis de serem observadas”, disse a palestrante, que é diretora e associada fundadora do Instituto Prospectiva (INSPRO).
De acordo com a especialista, que atua também no aconselhamento e avaliação de empresas e na gestão de start-ups, outro desafio pontual é o engajamento da sociedade civil no processo de construção das smart cities. “A sociedade civil organizada deve observar os indicadores e buscar atingir as metas para que a construção desse futuro seja desejável e realizável”, afirmou Clarice.
Dentro do painel “Indicadores Normalizados para Cidades e Comunidades Sustentáveis, Inteligentes e Resilientes (ISO ABNT 37120/37122/37123) e sua aplicação no Município de São Paulo”, Iara Negreiros, engenheira pela Poli-USP, com mestrado e doutorado em Engenharia e Planejamento Urbano, falou sobre o trabalho realizado desde 2015 em uma comissão da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), que vem espelhando as primeiras normas para as cidades e para indicadores para cidades da série 37100 (37120, que aborda as comunidades sustentáveis, 37122 sobre cidades inteligentes e 37123, que trata de cidades resilientes). O Brasil é um dos países que integram a ISO (International Organization for Standardization), importante organização internacional especializada em padronização, e é representado pela ABTN.
“O primeiro comitê da ISO que trata de cidades e comunidades sustentáveis foi o ISO/TC 268, criado em 2013. Dois anos depois foi criada uma comissão na ABTN para espelhar os questionamentos desse comitê para o Brasil: a ABTN/CEE-268 Comissão de Estudo Especial de Cidades e Comunidades Sustentáveis. Desde então atuamos na elaboração e publicação das Normas ISO para cidades, da série 37100. As normas não padronizam o fim, mas o processo, que é contínuo e focado em tornar as cidades mais inteligentes, resilientes e sustentáveis. Cada uma será inteligente à sua forma e respeitando a sua própria vocação de sustentabilidade. Desde 2014 até agora temos um arcabouço de 31 normas da ISO já publicadas nessa série e 17 em elaboração, que são as que estamos acompanhando no comitê”, explicou a especialista.
Geóloga pela Universidade Estadual Paulista, com mestrado e doutorado pelo Instituto de Geociências da USP e representante do TCMCP em plenárias da ABNT, Harmi Takiya falou sobre a plataforma Observa Sampa, disponível no portal da Prefeitura, que reúne indicadores já definidos pelo município de São Paulo. “Ressalto a qualidade dos dados e metadados (informações de como são calculados os indicadores) apresentados, a confiabilidade das fontes e a presença de série histórica, para que se possa acompanhar o desenvolvimento do indicador para definição de políticas públicas. Em 2014 a plataforma contava com 290 indicadores, atualmente são 274 indicadores, com 21 temas e classificação de ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) e até o final do ano serão agregados mais 119 novos indicadores”, pontuou a palestrante.
Falou, também sobre a aplicação dos indicadores normalizados da ISO ABNT 37120, 37122 e 37123 no município de São Paulo, citando um estudo da utilização deles para avaliar o impacto da Covid-19 na cidade, com a seleção de 47 indicadores dos diversos temas da ISO. “A divulgação dessas informações fortalece e qualifica os dados hoje acessíveis à população. É importante que possamos comparar os indicadores da cidade de São Paulo com os das outras cidades do Brasil para que sejam informações úteis para orientar as políticas públicas a serem implementadas pelos gestores”, avaliou Harmi.
Da Redação